• Marcia Carmo
  • De Buenos Aires para a BBC Brasil

Crédito, Reuters

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Líder da organização, Estela de Carlotto, se emocionou ao falar dos 36 anos buscando o bebê de sua filha

A presidente da entidade de direitos humanos Avós da Praça de Maio (Abuelas de Plaza de Mayo), Estela de Carlotto, anunciou nesta terça-feira que seu neto Guido, que ela buscava há 36 anos, foi localizado.

“Agora tenho meus 14 netos comigo. A cadeira dele e os porta-retratos dele que estavam vazios, já não estão mais. Eu vou abraçá-lo e quero olhar bem para ele. Já me disseram que parece com a gente, os Carlotto”, disse a avó, que tem 83 anos, diante das câmeras de televisão.

Segundo a mídia argentina, o jovem é pianista e seu nome Ignacio Hurban, embora já esteja sendo chamado de Guido Carlotto.

A presidente da entidade é conhecida pela luta na busca de filhos de desaparecidos políticos e, como recordou, ajudou a “recuperar” 113 outras pessoas sequestradas e entregues a outras famílias ainda bebês durante a ditadura argentina (1976-1983).

A organização costuma veicular anúncios nas emissoras de rádio e de televisão e no jornal Página 12 dizendo, geralmente, que se a pessoa tem dúvidas sobre sua identidade que procure o local e realize o exame de DNA.

Banco genético

A “Avós da Praça de Maio” possui um amplo banco de dados genéticos de familiares das vítimas da ditadura. Foi a partir desta base de dados que os demais bebês separados dos pais biológicos – e agora com mais de 30 anos – foram localizados.

“Ainda temos mais de 400 para serem localizados.”, disse a vice-presidente da entidade, Rosa Roisinblit, de 95 anos, sentada ao lado de Estela Carlotto. O neto de Rosa foi “recuperado”, como elas dizem, no ano 2000.

Nesta terça, Estela de Carlotto contou que quando a filha desapareceu em 1978, ela não sabia que a garota estava grávida. Só soube muito depois.

“Hoje, é um momento sonhado. O nome dele é Guido como o pai (de Laura). Meu neto certamente nasceu onde minha filha esteve (detida) e a história revelará a ação destes genocidas”, disse Estela.

Ela afirmou ainda que Laura e o companheiro, os pais do jovem agora identificado, eram do grupo político Montoneros. Segundo historiadores, o grupo era formado por opositores à ditadura e seus integrantes eram criticados por setores políticos que os acusavam de luta armada.

A avó lembrou ainda que o corpo da filha lhe foi entregue e que ela sabia que o neto, filho de Laura, estava vivo. “O que todas as avós queremos é que estas histórias nunca mais se repitam. Aqui comigo estão avós com muitos anos que continuam buscando seus netos.”

Ela disse ainda que seu neto mora com uma jovem, não tem filhos e cresceu com uma família simples em uma área rural.

A presidente da Avós da Praça de Maio disse que ele falará à imprensa quando tiver vontade e pediu que respeitassem os prazos e a privacidade dele. “Ele nos buscou. E me disseram que ficou surpreso ao saber hoje, quando saiu o resultado, que é meu neto.”, disse com olhos marejados. Ainda não se sabe quando os dois vão se encontrar.

Na entrevista à imprensa, rodeada por outros jovens que foram criados por outras famílias, e que também tiveram a identidade confirmada no banco de dados da entidade, ela contou que a presidente Cristina Kirchner ligou para ela e que “as duas choraram.”

Quando questionada sobre o que dizer às outras avós que ainda buscam seus netos, ela respondeu: “Que assim como os buscamos, eles também nos buscam”.

Estela afirmou que queria “compartilhar com todos a alegria enorme” e que acredita que Laura, “assassinada pelos genocidas, estava sorrindo do céu”.

“Buscamos os netos e hoje meu neto. E um prêmio para todos. Guido é um artista, um bom menino. Aconteceu o que dizíamos, que eles iriam nos buscar assim como nós os buscamos. E hoje me disseram que ele é meu neto em 99,9%”.

Clarín

Recentemente, Estela estava na expectativa de que um dos filhos adotados da empresária Ernestina de Noble, do grupo de imprensa Clarín, fosse Guido.

Após exames de DNA os dois jovens, uma mulher e um homem, não foram identificados entre os familiares das vítimas de desaparecidos políticos.

Integrante da Conadep (Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas) e mãe de um desaparecido politico, a ex-senadora Graciela Fernández Meijidi disse nesta terça. “É uma pena que algo tão terrível, que marcou a vida de todos nós, ainda não conte (entre os acusados) com um só arrependido por estes fatos tenebrosos.”