• Marcia Carmo
  • Para a BBC Brasil, em Buenos Aires

Crédito, CORTESIA

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Rogelio Goiburú trabalha hoje em busca de desaparecidos políticos no Paraguai

Filho de desaparecido político, o médico paraguaio Rogelio Goiburú, de 58 anos, disse que os 50 anos do golpe militar no Brasil deveriam ser a oportunidade para que documentos da chamada Operação Condor – como foi conhecida a aliança entre vários regimes militares da América Latina para coordenar ações de repressão a opositores – sejam revelados.

“Eu desejo que os países do Mercosul, começando pelo Brasil, que antes formavam o ‘Mercosul do terror’, se comprometam a investigar realmente como a operação funcionou, como foi financiada e que sejam investigados incessantemente os casos dos desaparecidos políticos na nossa região”, disse em entrevista à BBC Brasil, falando de Assunção.

“Necessitamos saber como os militares se comunicavam, como se organizavam para sequestrar, matar e fazer desaparecer seus opositores e qual foi a participação da CIA e do Pentágono naqueles anos no Cone Sul”, afirmou.

Goiburú é atualmente o diretor da Direção de Reparação e Memória Histórica do Ministério da Justiça do Paraguai. Ele deixou de exercer a medicina há nove anos, contou, para dedicar-se às questões ligadas à defesa de direitos humanos, trabalhando na busca de mais de 500 desaparecidos durante a ditadura do general Alfredo Stroessner, entre 1954 e 1989.

Entre estes desaparecidos está o seu pai, o médico Agustín Goiburú, que era opositor de Stroessner e integrante do Movimento Popular Colorado (Mopoco). Agustín foi sequestrado no exílio na Argentina, nos anos 70, e morto no Paraguai, em 1977, mas seu corpo não foi localizado.

“Minha busca chegou até o ponto em que meu pai foi morto no prédio do Estado Maior do Exército do governo de Stroessner e onde hoje funciona o escritório do Mercosul aqui em Assunção. Meu pai foi interrogado e morto ali mas continuo buscando onde ele foi enterrado”, afirmou.

Rogelio acompanha as escavações para a localização de desaparecidos políticos, que, nos últimos tempos, encontraram os restos mortais de 27 pessoas encontrados no país e que estão sendo identificadas com exames de DNA. Ele também criou uma página no Facebook sobre a busca dos desaparecidos da ditadura.

Brasil

Entre os desaparecidos paraguaios estão, além do pai de Rogelio, sete ativistas políticos do grupo ‘Movimento 14 de maio’ que teriam sido mortos no Brasil.

No primeiro caso, ocorrido antes da ditadura no Brasil, em 24 de dezembro de 1960, oito paraguaios fugiram do regime de Stroessner e foram apanhados por soldados do Paraguai em uma fazenda brasileira em Paranhos, no Mato Grosso do Sul.

“A informação que temos, contada por dois sobreviventes que já morreram, é que eles foram fuzilados na própria fazenda. Há cerca de dois anos estive com a secretária de Direitos Humanos do Brasil, Maria do Rosário, porque queremos saber onde eles foram enterrados. Mas agora ali existe uma enorme plantação de soja. Ficou mais difícil, mas não desistimos”, afirmou. Segundo ele, “toda a verdade” deve ser conhecida “para que se faça justiça e jamais se repita”.

O caso dos paraguaios foi contado no livro Masacrados en Nochebuena (‘Massacre no Natal’), de Efraín Cuevas.

Anos mais tarde, a paraguaia Soledad Barret, que era companheira de José Anselmo dos Santos, o cabo Anselmo, foi morta quando estava grávida dele.

De acordo com a imprensa brasileira, paraguaia e uruguaia, ela foi entregue por ele ao Dops de São Paulo e morreu com outros militantes políticos, contrários à ditadura, em 1973.

Arquivos de investigação apontam que a advogada Mercia Albuquerque contou que a viu “morta, rodeada de sangue, e com o feto aos seus pés”. Mas para o Paraguai, Soledad Barret, que também morou no Uruguai e em Cuba, é considerada “desaparecida política”.

“Aqui entendemos que ainda não foi localizado o local onde seu corpo foi enterrado e por isso a consideramos desaparecida”, disse Rogelio Goiburú. Segundo ele, foram realizadas investigações sobre os dois casos no Brasil. “Mas nada foi concluído”, afirmou.

Segundo Rogelio, o seu pai, Agustín, que era ativo opositor ao regime de Stroessner e se recusou a assinar falsos atestados de óbito de vítimas da ditadura, teria sido localizado no exílio graças ao esquema de troca de informações entre os agentes das ditaduras do Cone Sul, a Operação Condor.

“Nós morávamos exilados na Argentina, eu tinha vinte anos, e ainda hoje me pergunto como descobriram nosso paradeiro. Mas foi resultado da Operação Condor. Por isso, não só pelo meu pai, mas por todos os desaparecidos espero que o Brasil revele todos os documentos que tenha sobre aquele período de ditadura”, afirmou.

Para ele, apesar de afirmarem que muitos documentos terem sido destruídos, “certamente há militares e outros que devem ter papéis fundamentais guardados”.