- Author, Vinícius Lemos
- Role, Da BBC News Brasil em São Paulo
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ATENÇÃO: a reportagem a seguir tem descrições de violência que alguns leitores podem considerar perturbadores
Os gritos de socorro ecoam em meio à destruição causada por bombas lançadas na Faixa de Gaza. Embaixo de escombros de construções como prédios ou estabelecimentos comerciais há sobreviventes de ataques que clamam para ser salvos, segundo relato à BBC News Brasil do tradutor palestino Kayed Hammad, que está em Gaza.
Hammad conta que os cidadãos escutam os pedidos de ajuda, mas permanecem inertes diante da situação. “E nem mesmo os bombeiros conseguem ajudar, porque não há ferramentas para salvar essas pessoas. E estar ali tentando ajudar também é arriscar a própria vida.”
Ele afirma que as pessoas agonizam sob os escombros à espera de algum tipo de resgate ou até mesmo da morte.
“Dói muito ouvir quando as pessoas estão vivas, mas embaixo dos escombros, das casas destruídas. Você sabe que estão vivos, mas não consegue fazer nada para ajudar”, conta.
Até esta quarta-feira (18/10), pelo menos 3,3 mil pessoas foram mortas em ataques das forças de Israel em Gaza, segundo o ministro palestino da Saúde.
Até o momento, segundo autoridades locais, há cerca de 1,4 mil mortos em Israel.
‘Bombas por todos os lados’
Hammad nasceu na Faixa de Gaza e vive na área com a esposa, os quatro filhos e os pais da companheira dele. Eles moram no norte da região, área duramente afetada pelos bombardeios israelenses.
O palestino diz à BBC News Brasil que teve a casa em que vivia com a família completamente destruída. “Não restou mais nada. Perdemos tudo. Se a guerra acabar hoje, vamos para a rua.”
Hammad conta que a casa em que está atualmente com a família pertence a parentes distantes. Esta é a quarta ou quinta residência em que eles moram desde o início dos ataques. Eles saíram das anteriores porque elas também foram atingidas por bombas.
Pelas janelas, o tradutor e a família acompanharam a tragédia na Faixa de Gaza. “Ao longo da minha vida, já vi sete ou oito conflitos, mas nada assim como está sendo agora.”
Nessas janelas das casas em que ficou, ele afirma ter visto construções sendo atingidas por bombas e pessoas morrendo, além de outras tentando sobreviver embaixo dos destroços dessas construções.
“Vi muita coisa. Vi bombas por todos os lados, ao longo dos dias e noites. Estamos sem luz, sem água, sem comida, sem serviços sanitários, muitas casas destruídas, muita gente morta e ainda tem muita gente morta embaixo dos escombros, que não puderam ser retiradas por falta de ferramentas para isso”, lamenta o palestino.
“Nem eu, nem os bombeiros e nem ninguém poderia resgatar essas pessoas embaixo dos escombros. Os bombeiros, inclusive, tiveram duas estações bombardeadas dias atrás. Bombardearam algumas ambulâncias também”, relata o palestino.
Ao menos por ora, conta o tradutor, não há previsão para que ele ou a família deixem a região. Segundo Hammad, não há nenhum lugar seguro para o qual possam ir neste momento.
“Agora o nosso principal objetivo é ficar vivo, por um milagre. Não sabemos o que vai acontecer. As bombas caem por todos os lugares e a nossa sorte é ficar vivo junto com a minha família. Não temos nenhum escape disso, não existe nenhum lugar considerado seguro por aqui.”
Ele agradece por não ter perdido nenhum parente próximo. Entre os familiares distantes, diz não saber exatamente quem sobreviveu. “Não conseguimos falar por telefone com todos, então não sabemos. Pode haver muita surpresa quando a guerra acabar ou algo assim”, afirma.
O palestino e a sua família têm carregado o celular por meio de geradores sempre que possível.
E para sobreviver, ele diz, todos têm tomado água que não é potável e comido alguns alimentos comprados em mercados próximos que ainda estão abastecidos. “Mas evitamos sair nas ruas, porque fazer isso é arriscar a vida.”
Diante das inúmeras dificuldades, ele reclama da falta de ajuda. “Não deixaram entrar ajuda humanitária ou medicamentos. Não deixaram nada”, lamenta.
Nas áreas de fronteira com Gaza há comboios com alimentos e outros itens para auxiliar a população. No entanto, essas áreas estão fechadas desde o início da guerra e o abastecimento na região está severamente comprometido.
“Nós precisamos frear tudo o que estão fazendo com a gente aqui. Nós somos civis e temos direitos também, como todo o resto do mundo”, declara o palestino.