A Venezuela vive nesta quarta-feira mais um dia de violência e tensão, enquanto manifestantes mais uma vez saem às ruas para protestar – e todas as atenções se voltam ao líder opositor Leopoldo López, cuja prisão foi mantida.
López se entregou à polícia (em manobra acordada com o governo) na terça-feira, acusado de incitar violentos protestos anti-chavistas. Nesta quarta, ele se apresentou perante a Justiça venezuelana, que determinou que ele continuará detido em cadeia em Los Teques, perto de Caracas.
Nas ruas, foram registradas novas manifestações. Segundo a agência EFE, o Ministério do Interior confirmou que subiu a seis o número de mortos nos enfrentamentos ocorridos durante os protestos; há também relatos de quatro feridos a bala no estado de Bolívar (sudeste) em uma passeata pró-governo.
O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, discursou em cadeia nacional de rádio e TV, prometendo esforços para deter a violência nas ruas e agregando que “se tiver que decretar estado de exceção e meter os tanques (no convulsionado estado de Táchira), estou pronto para isso”.
Correspondentes da BBC Mundo informam que, enquanto o presidente falava, escutavam-se tiros e enfrentamentos no município de Chacao, a leste de Caracas.
À noite, em partes da capital e de outras cidades venezuelanas, opositores do governo usavam apitos e faziam panelaços para protestar; havia também focos de incêndios e de enfrentamentos entre manifestantes e policiais.
O diretor para as Américas da ONG Human Rights Watch, José Luis Vivanco, criticou nesta quarta o “silêncio” dos governos do continente a respeito dos protestos e chamou de “lamentável e desalentador” que Brasil e Argentina tenham dado declarações de solidariedade ao governo venezuelano (os países se pronunciaram via Mercosul, que emitiu comunicado chamando as manifestações da oposição de “ações criminosas”).
Dentro da Venezuela, a população acompanha o desfecho da prisão de López, líder que tenta se cacifar como principal voz da oposição radical e que cresce na mesma medida da polarização do país.
A seguir, entenda quem é López e as acusações contra ele:
Quem é Leopoldo López?
O carismático López, líder do grupo Voluntad Popular, virou referência da ala radical da oposição venezuelana, num momento em que grande parte do país sofre com a inflação, a escassez de alimentos, a crise econômica e a violência.
López é acusado de ser o autor intelectual da onda de protestos violentos que tomou a capital do país nos últimos dias. As marchas ganharam contornos violentos na quarta-feira da semana passada, quando três homens foram mortos durante um protesto contra o governo.
O governo acusa López de incitar a violência e de tentar um golpe de Estado, enquanto a oposição afirma que os homens foram assassinados por milícias pró-governo.
Perante a Justiça, ele deve responder a acusações diversas, como homicídio intencional qualificado e por motivos fúteis, terrorismo e danos a propriedade pública.
Qual sua situação legal?
Ele passou a noite de terça-feira detido, e a Justiça determinará se ele será de fato indiciado pelos crimes de que é acusado.
A Promotoria venezuelana terá 45 dias para investigá-lo e decidir se pedirá seu julgamento ou se o caso será encerrado (o que resultaria em sua libertação).
O que diz o governo?
Na terça, após a prisão de López, Maduro disse que o opositor deveria responder à Justiça por ser “o chefe político da direita fascista venezuelana”.
Na semana anterior, o presidente havia qualificado os protestos antigoverno de levante “nazifascista” que almeja o golpe de Estado.
O que diz a defesa?
López deixou gravada uma mensagem em vídeo (divulgado nesta quarta) antes de se entregar, alegando que foi detido “injustamente por sonhar com uma Venezuela melhor” e que sua prisão “é mais um abuso do governo”.
Um de seus advogados, Bernando Pulido, disse à BBC Mundo que pediria à Justiça anulasse a prisão preventiva para que seu cliente pudesse aguardar em liberdade a um eventual julgamento.
Como fica o restante da oposição?
A situação de López também traz incômodos para a oposição moderada.
Os principais dirigentes anti-chavistas não concordam com o tom violento e sem objetivos claros impresso por López às manifestações, ainda que a admissão pública disso lhes crie constrangimentos.
Na disputa interna da oposição, está o apoio das classes populares, a base do chavismo. Neste setor, o opositor moderado Henrique Capriles, governador de Miranda, é mais bem aceito que López.
A historiadora Margarita López Maya opinou à BBC Brasil que, em meio à disputa pela liderança da coalizão de oposição, López obrigou os demais partidos de oposição a apoiá-lo em uma jogada política com a qual não estavam de acordo.
“López se fortalece. É uma jogada audaciosa que faz sombra a Capriles”, afirmou. “O jogo de se fazer de vítima dá crédito político. Os holofotes estarão sobre ele agora.”